domingo, 9 de fevereiro de 2014

TOMBO

Cair. Como um ébrio. Um tijolo que parte.
Aparar o tombo com as mãos. Um tipo de arte.
Sobre- avisos dos querubins que me seguram pelo cangote
E dizem: “Não se parte!
As mãos em sangue. Sentada no chão. O joelho um traste.
Vem a lição que eu sei de D’us parte:
Diminui o teu passo. Entra no compassado.
Pra que tanta pressa filho do Homem?
Aprecia a Vida, sem desastres.
Dia de curar as feridas, da pele, da alma,
Dia de entender que perder equilíbrio
É momento de reflexão
Tempo de curar chagas.
Do corpo e do coração.
Também de um tombo
Se renasce!
**Rosely Maria  Selaro**

28/4/13










































PASSARADA


A passarada assenhoreou-se da janela porque sabia, dentro dela estava eu. Naquele quarto, naquela cama, entregue a sonhos. Olhos lavados de um pranto consumado por realidades tão distantes.

Chorei. Chorei tanto que me desfiz e escorri até a janela. Olhando por uma fresta dela vi a passarada alegremente cantando. Piava. Gorjeava e abarrotava de cores aquela minha tosca janela.

Percebi a passarada porque o dia raiava e com ele o sol, o calor, rumores, dores, amores...

Reparei no dia nascido e num impulso, nas derradeiras forças do meu corpo, abrí, intrepidamente minha janela e saí por ela.

Voei ritmada junto da passarada sobre bosques, lagos, cidades e me pus a rir de mim mesma. Quanto tempo perdido, quanta vida guardada.

Abre as janelas de tua vida e sai voando. Se tombares, levanta tantos voos quantos possa. Se te consomes como eu, por tudo, por nada,
serás uma vaga lembrança de quem jaz atrás de uma mera janela.

 O mundo é a janela. A vida é fora dela. Hoje sou pássaro – canto nas manhãs em todas as janelas de quem quer asas para alçar vôo.

Rosely Maria Selaro

9.7.12      

SALVADOR SELLARO



Não ia falar de Meu Pai hoje. Não ia. Mas me veio à mente uma situação que vivi em Cajobi - Terra de minha mãe, que ele adotou e que denominava " reino encantado" . Na Casa grande e arejada de Cajobi havia um pomar e em fevereiro quando era época de pinha eu sempre estava lá. Eu adoro pinha e sempre tinha muita. E eu me deliciava! Por algum motivo fui antes das pinhas madurarem. Os pés estavam carregadinhos e eu passava horas a contemplá-los com Meu Pai aos meus ouvidos: "Zely, esta tão tarda a madurar. Está de vez. Olha esta outra filha. Você não vai embora, vai? "Vou sim Pai. Este ano vou ficar em pinha. Preciso voltar." E voltei. De fato, sem me lambuzar nas minhas Pinhas.

Uns dois ou três dias depois, a campainha toca. É o carteiro segurando uma caixinha da papelão. E vinha de Meu Pai. Salvador Sellaro - Rua da Bandeira 460 - Cajobi - São Paulo.

Qual não foi minha surpresa: Na caixinha estavam duas pinhas lindas e maduras olhando para mim e mais um bilhetinho: "Zely, logo que você foi embora eu percebi que os passarinhos se amontoavam num dos pés toda manhã e à tardinha. Deu para salvar estas duas que eles não bicaram. Beijos filha."

Eu não sei o que fiz primeiro: Se chorei ou comi as pinhas.

Este é Meu Pai - Salvador Sellaro - que me mandou pinhas maduras da Casa de Cajobi, para mim, pelo Sedex.

Nada mais a declarar. Ah! Só um recadinho para ele: "Pai, vai cuidando das pinhas aí onde você está. Quando eu te encontrar, que seja tempo de pinha madura, Pai. Eu te amo, eternamente."

Sua filha, Zely (assim que ele sempre me chamava!)









BAÚ

Dei pra revirar aquele antigo baú. Catei de lá meu primeiro beijo. Roubado! Marcado pra sempre nos meus quinze anos. Meu primeiro amor para a vida toda que durou talvez... um verão. A desilusão mais forte, a mais nobre em sua crueldade, peguei com minhas próprias mãos. E ela, feito polvo me enrolava em seus tentáculos tão forte, tão forte, que entendi: Não há fundo de baú que destrua desilusão. O velho baú tinha um ranço da minha vaidade. Cabelos louros. E baixou uma leve saudade daquilo que não fiz. As paixões estavam todas ali. E eu me perguntando: Meu Deus, como consigo manter estas inutilidades aqui? E joguei-as ao vento. Elas saíram chorando. Era o resto do meu pranto ainda guardado ali. Retratos amarelos. Daqueles que partiram. E continuam sempre belos. Tatuei-os na palma da mão. Baú de maldades, amizades. Baú que um dia foi presente. Hoje se prepara para sua última tarefa. Libertar o meu coração!

3/6/13